Como compreender um texto

Depois do nosso último artigo em que falamos sobre a utilidade da língua, alguns leitores me indagaram em nossa fanpage a respeito de como podem estudar para fazer a prova do Enem. Penso que ainda dá tempo de estudar para fazer bem a prova, mas é necessário um plano de estudos que contemple todo o Ensino Médio. Mas é possível focar naquilo que tem caído com mais regularidade nos exames. Como nosso blog trata principalmente da leitura e análise de textos, o artigo anterior e os próximos tratarão dos mecanismos que ajudam na hora da prova de interpretação de textos. Hoje, veremos com um pouco mais de detalhes como devemos fazer para compreender melhor os textos que aparecem nas provas, vestibulares e concursos.

A compreensão de textos

Para iniciarmos a conversa, algumas considerações devem ser feitas. São elas:

  • O indivíduo aprende naturalmente a língua da sociedade em que vive, graças ao convívio com os seus pares.
  • Quando um brasileiro, por exemplo, afirma que não sabe Português, isso só pode ser interpretado em dois sentidos: ou ele está querendo dizer que não sabe a variante culta do Português, ou
    que não sabe justificar por meio de regras o uso da língua aprendido naturalmente.
  • Falar com correção tem sua importância, mas não é suficiente para indicar bom desempenho no uso de uma língua.
  • O domínio versátil de uma língua se mede basicamente pela capacidade de compreender e produzir textos com a maior eficiência possível.
  • Mais importante que falar correto é ser capaz de apreender significados e correlacioná-los com outros que circulam no universo cultural.
  • Quando se discute a questão do bom desempenho no uso da língua, há certos mal-entendidos que precisam ser esclarecidos. Um deles é que falar bem é o mesmo que falar difícil ou falar "bonito" como as pessoas consideradas chiques. Há situações em que "falar difícil ou bonito" soa como pretensioso e grotesco, sendo, portanto, inadequado.

Antes de passarmos para os exercícios, fica minha dica para quem quer dar uma guinada na forma como lê e guarda as informações.

a culpa é das estrelas

Bem, depois dessas considerações, vejamos alguns exercícios práticos sobre o assunto. Assim como em outras disciplinas, aprende melhor quem pratica.

Texto para os exercícios de 1 a 3

(ENEM) Para falar e escrever bem, é preciso, além de conhecer o padrão formal da língua portuguesa, saber adequar o uso da linguagem ao contexto discursivo. Para exemplificar este fato, seu professor de Língua Portuguesa convida-o a ler o texto "Aí, galera", de Luís Fernando Veríssimo. No texto, o autor brinca com situações de discurso oral que fogem à expectativa do ouvinte.

Aí, galera

Jogadores de futebol podem ser vítimas de estereotipação. Por exemplo, você pode imaginar um jogador de futebol dizendo "estereotipação"? E, no entanto, por que não?
- Aí, campeão. Uma palavrinha pra galera.
-  Minha saudação aos aficionados do clube e aos demais esportistas, aqui presentes ou no recesso dos seus lares.
-  Como é?
- Aí, galera.
-  Quais são as instruções do técnico?
-  Nosso treinador vaticinou que, com um trabalho de contenção coordenada, com energia otimizada, na zona de preparação, aumentam as probabilidades de, recuperado o esférico, concatenarmos um contragolpe agudo com parcimônia de meios e extrema objetividade, valendo-nos da desestruturação momentânea do sistema oposto, surpreendido pela reversão inesperada do fluxo da ação.
-Ahn?
-  É pra dividir no meio e ir pra cima pra pega eles sem calça.
-  Certo. Você quer dizer mais alguma coisa?
-  Posso dirigir uma mensagem de caráter sentimental, algo banal, talvez mesmo previsível e piegas, a uma pessoa à qual sou ligado por razões, inclusive, genéticas?
-  Pode.
-  Uma saudação para a minha progenitora.
-  Como é?
- Alô, mamãe!
-  Estou vendo que você é um, um...
-  Um jogador que confunde o entrevistador, pois não corresponde à expectativa de que o atleta seja um ser algo primitivo com dificuldade de expressão e assim sabota a estereotipação?
-  Estereoquê?
-  Um chato?
-  Isso.

Luís Fernando Veríssimo. Correio Braziliense, 13/5/1998.

1. (Enem) A expressão "pega eles sem calça" poderia ser substituída, sem comprometimento de sentido, em língua culta, formal, por:
a) pegá-los na mentira.
b) pegá-los desprevenidos.
c)  pegá-los em flagrante.
d) pegá-los rapidamente.
e) pegá-los momentaneamente.

Resposta: B

2. (Enem) O texto retrata duas situações relacionadas que fogem à expectativa do público. São elas:
a) A saudação do jogador aos fãs do clube, no início da entrevista, e a saudação final dirigida à sua mãe.
b) A linguagem muito formal do jogador, inadequada à situação da entrevista, e um jogador que fala, com desenvoltura, de modo muito rebuscado.
c)  O uso da expressão "galera", por parte do entrevistador, e da expressão "progenitora", por parte do jogador.
d) O desconhecimento, por parte do entrevistador, da palavra "estereotipação", e a fala do jogador em "é pra dividir no meio e ir pra cima pra pega eles sem calça".
e)  O fato de os jogadores de futebol serem vítimas de estereotipação e o jogador entrevistado não corresponder ao estereótipo.

Resposta: B

3. (Enem) O texto mostra uma situação em que a linguagem usada é inadequada ao contexto. Considerando as diferenças entre língua oral e língua escrita, assinale a opção que representa também uma inadequação da linguagem usada ao contexto:
a) "O carro bateu e capoto, mas num deu pra vê direito." - um pedestre que assistiu ao acidente comenta com o outro que vai passando.
b) "E aí, ô meu! Como vai essa força?" - um jovem que fala para um amigo.
c)  "Só um instante, por favor. Eu gostaria de fazer uma observação." - alguém comenta em uma reunião de trabalho.
d) "Venho manifestar meu interesse em candidatar-me ao cargo de Secretária Executiva  desta  conceituada  empresa." - alguém que escreve uma carta candidatando-se a um emprego.
e) "Porque, se a gente não resolve as coisas como têm que ser, a gente corre o risco de termos, num futuro próximo, muito pouca comida nos lares brasileiros." -um professor universitário em um congresso internacional.

Resposta: E

4.  Observe a ilustração.

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a) Tapando com um papel o A e o C, como se lêem os elementos dispostos na linha vertical?
Resposta: Lê-se uma sequência de algarismos: 12,15 e 14.

b) Tapando, agora, os números 12 e 14, como se leem os elementos dispostos na horizontal?
Resposta: Lê-se uma sequência de letras: A, B e C.

c) Tente explicar por que um mesmo elemento pode ser interpretado como um algarismo ou como uma letra.
Resposta: O elemento do centro é Interpretado como algarismo quando se encaixa na sequência de algarismos; é interpretado como letra quando ee encaixa na sequência de letras. Isso quer dizer que a Interpretação do significado de uma parte dependo do contexto em que se encaixa.

Instruções para os exercícios 5 e 6

Decifrar o significado das palavras de um texto é necessário para compreendê-lo, mas não é suficiente. Observe com atenção esta reportagem:

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5. A manchete "Fê-lo porque qui-lo", por estranho que pareça, está escrita em Português. Ocorre que se trata de um linguajar que só se usa em situações muito restritas. Daí a dificuldade de compreensão. Mas, estudando a Gramática Normativa ou com a ajuda do professor, você vai traduzir o significado do trecho citado, apesar da sua estranheza. Procure registrar a sua resposta.
Resposta: Fê-lo porque qui-lo significa “Fez isso porque quis fazer isso”. “Fê-lo" equivale a "fez-o" (o o pode ser interpretado como “isso”).

6. Mesmo com a explicação do professor ou suas leituras, é possível que você ainda não tenha compreendido inteiramente o significado dessa manchete. Isso serve para demonstrar que, para entender um texto, não basta decifrar o sentido das palavras que o compõem. Mais do que isso, é preciso compreender que relações existem entre o texto lido e outros textos que circulam dentro do mesmo universo cultural. A compreensão do sentido dessa manchete pressupõe que se conheçam dados como os que vêm expostos a seguir.

O folclore político atribui ao ex-presidente Jânio Quadros a famosa expressão "Fi-lo porque qui-lo" (que seria igual a "Fiz isso porque quis fazer isso"). Embora ele próprio sempre tenha negado tê-la proferido, essa expressão passou para a história como uma forma de caracterizar a esquisitice e a extravagância desse nosso ex-presidente. O estilo excêntrico não era característica apenas do seu modo de falar, mas também do seu modo de agir. Instável e imprevisível, Jânio Quadros tomou atitudes extravagantes, caprichosas, provocantes e incompreensíveis, como foi o caso de sua renúncia repentina ao mandato de presidente.
Levando em conta esses dados, procure responder qual foi a intenção do repórter ao colocar na boca de Bóris Ieltsin, presidente da Rússia, uma frase semelhante a essa atribuída a Jânio Quadros?
Resposta: O repórter dá a entender que há uma semehança de caráter e de comportamento político entre Jânio Quadros e Bóris Ieltsin, utilizando uma fictícia semelhança de linguagem. O conhecimento que se tem sobre o ex-presidente brasileiro ajuda a compreender a figura humana e a atuação política do então presidente russo.

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