Nunca escondi minha admiração por alguns autores. É assim com Machado de Assis, Clarice Lispector, Mário Quintana e, dentre muitos outros, José de Alencar. Dentre esses, Fernando Pessoa tem destaque especial. Incompreendido por muitos, ignorado por outros, nosso místico poeta nos deixou obras incríveis para os mais sensíveis olhos. Escolhi dentre algumas leituras que fazia em preparo às aulas da semana alguns trechos dele. Espero que gostem e que sejam bastante significativos nesta semana.
Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.
Fernando Pessoa, 18-9-1933
Tão abstrata é a idéia do teu ser
Que me vem de te olhar, que, ao entreter
Os meus olhos nos teus, perco-os de vista,
E nada fica em meu olhar, e dista
Teu corpo do meu ver tão longemente,
E a idéia do teu ser fica tão rente
Ao meu pensar olhar-te, e ao saber-me
Sabendo que tu és, que, só por ter-me
Consciente de ti, nem a mim sinto.
E assim, neste ignorar-me a ver-te, minto
A ilusão da sensação, e sonho,
Não te vendo, nem vendo, nem sabendo
Que te vejo, ou sequer que sou, risonho
Do interior crepúsculo tristonho
Em que sinto que sonho o que me sinto sendo.
Fernando Pessoa, 12-1911
O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.
13-6-1930 ~ Livro do Desassossego por Bernardo Soares
Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?
Livro do Desassossego
Por fim, algo que é bem verdadeiro para mim.
"Pedras no caminho?
Guardo todas.
Um dia vou fazer um castelo..."
Você conhece a poesia de Fernando Pessoa? Tem alguma preferida? Conte-nos.
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2 Comentários
Eu tenho especial carinho por Fernando Pessoa.
ResponderExcluirQuando estava na faculdade, um professor, mais que especial (Mauro Luiz Rovai), preparava sua tese que era: "Memória em Álvaro de Campos". Adorava esse professor e passei a gostar e me interessar por Fernando Pessoa também.
Um poema que venero e que ficou muito popular cantado na voz de Fagner é esse:
"Qualquer música, ah, qualquer,
Logo que me tire da alma
Esta incerteza que quer
Qualquer impossível calma!
Qualquer música - guitarra,
Viola, harmônio, realejo...
Um canto que se desgarra...
Um sonho em que nada vejo...
Qualquer coisa que não vida!
Jota, fado, a confusão
Da última dança vivida...
Que eu não sinta o coração!"
E, desses que colocou, isto me soa como verdade incontestável:
"Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,"
e, ele, sabia bem o que dizia de vidas vividas e vidas pensadas, né?
Só pode ser maravilhosa uma semana que começa assim!
Beijos
Não deixa de ser salutar uma “dessacralização” do Fernando Pessoa da pessoa que foi ele. Dos poemas e sua vida literária, gosto muito!
ResponderExcluir"Como é por dentro outra pessoa?
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Como que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.
Nada sabemos da alma senão da nossa;
As dos outros são olhares, são gestos, são palavras,
Com a suposição de qualquer semelhança no fundo."
Boa semana!!